6 bilionários têm mesma riqueza que 100 milhões de brasileiros mais pobres
No Brasil, os seis maiores bilionários têm a mesma
riqueza que os 100 milhões de brasileiros mais pobres. Caso o ritmo de inclusão
no mercado de trabalho prossiga da forma como foi nos últimos 20 anos, as
mulheres só terão os mesmos salários dos homens no ano de 2047, e apenas em
2086 haverá equiparação entre a renda média de negros e brancos.
De acordo com projeções do Banco
Mundial, o país terá, até o fim de 2017, 3,6 milhões a mais de pobres. Essas
são as constatações do relatório "A distância que nos une, um retrato das
desigualdades brasileiras", divulgado nesta segunda-feira (25) pela Oxfam
Brasil.
A organização, que trabalha no combate
à pobreza e à desigualdade, resolveu publicar, pela primeira vez, um estudo em
que investiga, com base em vários dados, as raízes e soluções para um país onde
se distribui de forma desigual fatores como renda, riqueza e serviços
essenciais.
De acordo com Katia Maia,
diretora-executiva da entidade, o objetivo é divulgar um relatório anual sobre
a desigualdade e mostrar os diferentes problemas do tema, como, por exemplo, o
da tributação brasileira.
"Nós pagamos muitos impostos. Mas
não é que a nossa tributação é excessiva, na verdade ela é injusta. A gente
está abaixo da média dos países da OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico) [em termos de carga tributária]. Mas é uma
tributação onde quem paga o pato é a classe média e as pessoas mais
pobres", disse.
TRIBUTAÇÃO INDIRETA
O documento identifica falhas na forma
como o imposto é arrecadado no Brasil, em contraste com outros países. Além da
alta tributação indireta, há questionamentos à isenção de impostos sobre lucros
e dividendos de empresas e à baixa tributação de patrimônio, que, com isso,
acabam contribuindo para aumentar a concentração de renda dos mais ricos.
A coordenadora do relatório defende que
é possível que as autoridades brasileiras combatam fatores que impedem a
tributação proporcionalmente igualitária, mesmo antes de uma necessária reforma
tributária. Um deles é a evasão tributária, em que somente em 2016, segundo o
Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda (Sinprofaz), deixaram de ser
arrecadados R$ 275 bilhões.
Como pontos positivos dos últimos anos,
o relatório credita ao mercado de trabalho o "principal fator" da
recente redução da desigualdade de renda no Brasil.
Com a estabilização da economia e da
inflação nos últimos 20 anos, foi possível ao país investir na queda do
desemprego, na valorização real do salário mínimo e no aumento do mercado
formal. Há diferenças, porém, que ainda precisam ser enfrentadas, de acordo com
o relatório. Ele também enumera dados sobre as já recorrentes diferenciações
salariais entre mulheres/homens e negros/brancos que possuem a mesma
escolaridade.
"A média brasileira de anos de
estudo é de 7,8 anos, abaixo das médias latino-americanas, como as do Chile e
Argentina (9,9 anos), Costa Rica (8,7 anos) e México (8,6 anos). É ainda mais
distante da média de países desenvolvidos", indica o estudo,
complementando que apenas 34,6% dos jovens de 18 a 24 anos estão matriculados
em universidades, dos quais apenas 18% concluem o curso.
JUVENTUDE NEGRA E POBRE É A MAIS
AFETADA
"Em geral, a juventude negra e
pobre é a mais afetada pelas barreiras educacionais. Baixo número de anos de
estudo, evasão escolar e dificuldade de acesso à universidade são problemas
maiores para esses grupos, que, não por acaso, estão na base da pirâmide de
renda brasileira", afirma.
Para Katia Maia, a construção da
sociedade brasileira é baseada em uma divisão entre cidadãos de "primeira
e de segunda categoria.
"Os números são muito fortes: 80%
das pessoas negras ganham até dois salários mínimos, e estamos falando de 50%
da população brasileira. A gente olha no nosso entorno e vê as bolhas de
pessoas brancas, enquanto as negras são colocadas na periferia da cidade. É
importante a gente debater e conversar sobre o racismo, mostrando que somos
iguais. Esse déficit a gente tem de assumir, que somos país racista e enfrentar,
buscar solucionar isso. É grave porque do jeito que estão colocados, os números
falam por si, a gente quase não resolve isso nesse século", alerta.
Embora aponte uma "notável
universalização do acesso à educação básica", o relatório pede cuidados
para lidar com a evasão escolar, especialmente em séries mais adiantadas. No
que diz respeito a outros serviços essenciais, apesar de elogiar uma
"importante expansão" nos últimos anos, o documento coloca como
desafio a ampliação do acesso de mulheres e negros ao sistema público de saúde.
O documento lembra –como exemplos de
desigualdade– a situação de dois dos 96 distritos de São Paulo, a maior cidade
brasileira: "Dados mais recentes dão conta de que, em Cidade Tiradentes,
bairro de periferia de São Paulo, a idade média ao morrer é de 54 anos, 25 a
menos do que no distrito de Pinheiros, onde ela é de 79 anos. Trata-se de um
dado que resume como as desigualdades se manifestam de diversas formas, sempre
a um preço muito alto para a base da pirâmide social no Brasil".
Com elogios à redução geral da
desigualdade de renda e pobreza após a promulgação da Constituição Federal de
1988, o relatório considera ainda a retirada, nos últimos 15 anos, de 28
milhões de pessoas da pobreza e a saída do Brasil do Mapa da Fome, em 2015.
A parcela da população abaixo da linha
da pobreza caiu, entre 1988 e 2015, de 37% para 10%, conforme o estudo. Devido
à crise econômica dos últimos anos, porém, os governos têm feito "mudanças
radicais" que, segundo o levantamento, evidenciam uma "acelerada
redução do papel do Estado" que "aponta para um novo ciclo de aumento
de desigualdades", segundo a organização.
GARANTIA DE DIREITOS
A Emenda do Teto dos Gastos, que limita
os gastos públicos por 20 anos, é considerada no documento como um "largo
passo atrás na garantia de direitos".
De acordo com as constatações da Oxfam
Brasil, há a necessidade de se revisar a reforma trabalhista aprovada
recentemente pelo Congresso Nacional, "onde ela significou a perda de
direitos". Outros entraves ao fim das "desigualdades extremas"
do Brasil, segundo a pesquisa, são a melhoria dos mecanismos de prestação de
contas, mais transparência, combate à corrupção e uma "efetiva regulação
da atividade de lobby".
De acordo com Katia, a meta do
relatório não é defender que todas as pessoas tenham a mesma coisa e sim
mostrar os extremos que não devem ser aceitos pela sociedade. No dia em que se
completam dois anos da assinatura dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável
(ODS) pelos 193 Estados Membros da ONU, com metas para os países até 2030, a
coordenadora do relatório acredita, corroborando o documento, que as
desigualdades "não são inevitáveis".
"Elas são fruto de decisões
políticas, de interesses, e nos níveis que nós temos hoje no Brasil, são
eticamente inaceitáveis. Estamos construindo uma sociedade onde uma parte da
população vale mais que outra. Não pode ser assim, somos todos parte da mesma
sociedade. Essa distância entre nós está tão grande que a única forma de
reduzir é atuando juntos, nos unindo", finaliza.
FONTE: DA
AGÊNCIA BRASIL - 25/09/2017
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